Primeiramente nada mais lógico que transcrever o texto, em tradução livre, dito pelo suposto padre (ou pastor, se preferir): “Tudo é mais complicado do que você pensa. Você só vê um décimo da verdade. Há um milhão de consequências ligadas a qualquer decisão sua; você pode destruir a sua vida todas as vezes que você toma uma decisão. Mas talvez você não perceba isso por 20 anos. E você nunca conseguirá traçar o caminho até a origem. E talvez você só tenha uma oportunidade de fazer isso. Apenas tente sair do seu próprio divórcio. E eles dizem que não existe fé, mas existe: é aquilo que você cria. Mesmo que o mundo continue existindo por milhões e milhões de anos, você está aqui por uma fracção de uma fracção de um segundo. A maior parte do tempo você passa estando morto ou aguardando a vida. Mas enquanto está vivo, você espera em vão, desperdiçando anos, por uma ligação ou uma carta ou um olhar de alguém ou de alguma coisa que fará tudo ficar bem. E nunca vem ou parece que vai vir, mas acaba não vindo. E você passa o seu tempo arrependido, ou com alguma vaga esperança que algo bom virá algum dia. Algo que te faça sentir conectado, te faça sentir parte de um todo, te faça sentir amado. E a verdade é que estou tão puto e a verdade é que estou tão triste, e a verdade é que eu me sinto tão magoado por tanto tempo e até agora eu apenas estive fingindo estar tudo bem, só para seguir em frente, só para eu não sei por que, talvez porque ninguém queira ouvir sobre o meu sofrimento, porque todos já tem o seu e o seu próprio é muito grande para permitir-lhes ouvir ou se importar com o meu. Bom, fodam-se todos. Amém.”
Talvez se os padres ou pastores largassem o discurso pronto, as palavras “reconfortantes” ou os ensinamentos bíblicos, e dissessem algo assim, genuíno, sincero até ao osso. Não existe felicidade nesta vida, a não ser que você invente uma, acreditando no deus que lhe convém, em alguma espécie de futuro prometido – um paraíso onde o caos, o sofrimento e o desespero não tenham lugar. Caso contrário, você está preso nesse mundo, numa contagem regressiva para algo que você não faz idéia do que possa ser, e que talvez não exista. Mas esse cronómetro é curto demais perto dos bilhões de anos de idade deste fantástico universo, ainda incompreendido e desconhecido. Talvez por isso seja importante fugir desse abismo que é a nossa mera existência, afinal, quando olhamos o abismo, este olha novamente para você, como diria o saudoso e odiado Nietzsche.
Quando paramos para lamentar das decisões que tomamos, numa tentativa frustrada de descobrir a origem do erro, fazemos com que sejamos apenas expectadores das nossas próprias vidas ou ainda simples actores dirigidos mecanicamente: os anos passam e mal conseguimos seguir a passagem do tempo, não porque aproveitamos tanto que mal percebemos, mas porque estivemos boa parte desse tempo presos ao passado e a uma idéia utópica de felicidade, seja com um antigo amor, em alguma actividade que fizemos lá atrás. Talvez seja a hora do Homem admitir essa incapacidade de lidar com a própria finitude e que faz com que o mesmo invente meios de diminuir o sofrimento, numa tentativa de transformar a realidade e todas as suas implicações em algo tolerável, com sentido e até belo.
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